domingo, 9 de agosto de 2015


Imerso no silêncio dos céus, sinto a felicidade de ter os meus dois irmãos. Nasci no meio deles. Cresci entre eles. Sou um deles.

O que sinto por eles é muito diferente do que um filho sente por um pai ou que um pai sente por um filho. Não há uma dívida como para com os pais. Não há um dever como para com os filhos. Há, antes, uma cumplicidade que é difícil de descrever.

Por vezes penso em como seria muito improvável ser amigo deles, se não fosse irmão. Sou muito selecto com amigos. Mas eles são os meus melhores. Porque são os meus irmãos. Não precisamos gostar das mesmas coisas nem ter concepções de vida semelhantes. Mas são os meus cúmplices.

Ninguém, absolutamente ninguém, me acompanhou nesta viagem de 39 anos como eles acompanharam. A Inês já só me conheceu aos 16 e as meninas depois dos 26. Pais e avós viram-me nascer, mas a partir do altar da experiência das suas vidas. Os meus irmãos não, esses acompanharam-me desde o início partilhando desde o primeiro dia esse trajecto.

Começámos por partilhar muitas coisas de que nem sequer tenho consciência. Partilhámos a pureza da infância, as brincadeiras, a bola, a areia e a terra, os arranhões, a praia e os escaldões, a casa dos avós e as viagens enormes nos carros dos pais. Partilhámos a nossa mãe de trinta e poucos anos e o nosso pai quarentão. Nunca fomos três. Fomos sempre os três. Partilhámos o desafio da adolescência, os amigos, as raparigas, as notas e os professores, as bicicletas e os arrepios às ordens dos pais. Partilhámos as frustrações, as inseguranças e os medos. Partilhámos o labor dos nossos pais. Partilhámos o Amor dos nossos pais. Partilhámos a constituição das nossas famílias, os nossos casamentos e o nascimento dos nossos filhos. Alargámo-nos. Vimos os nossos pais envelhecerem e vimo-nos, juntos, a ocupar o lugar que antes era deles. Deixámos de ser miúdos ao mesmo tempo.

Passámos 38 anos imensamente perto. Lado a lado. Ou no meio, no meu caso. Nasci no meio. Sempre fui o do meio. No quarto do meio. No lugar do meio no banco de trás do carro. No lugar do meio à mesa de refeição. Menos um ano que o mais velho. Mais um ano que o mais novo.

Não consigo descrever o quanto me inspira o meu irmão Ricardo. É o meu irmão mais velho. Tranquiliza-me, pacifica-me. A cada dia que passa sinto-me mais perto dele. Fala pouco sobre sentimentos, sempre falou. Não foi uma criança muito fácil, nem muito segura do seu destino. Tinha medos apesar de ser corajoso. Foi o primeiro, para todos os efeitos. Mais protegido. Soube crescer. Foi o que esteve sempre mais perto dos pais. E soube aprender com eles. Recolher os seus valores. Ganhou uma paz interior que nunca acreditei ser possível. É um guerreiro e um sonhador. Defende agora os seus próprios valores. Está em harmonia com a vida. Retira dela o que tem de melhor. E contagia-me.

O João é o meu irmão mais pequeno. É o Pini. Ou Shumba. Ou Shimba. Ou Shumagala. Ou Johnny. Ou simplesmente Bro. Este é mais complicado, terceiro filho. Teve de lutar para ganhar o seu espaço. E ganhou. A prova disso é que se perguntarem a terceiros quem é o filho preferido dos pais, é melhor apostarem tripla. Sempre foi pequenino, o mais pequeno. É o melhor irmão de todos os três (envergonho-me de ser o pior, mas tenho melhorado, acho). Realiza-se a ajudar. É cheio de vida e juventude. Dizem que faz 38 anos este ano mas acho que nos devemos ter esquecido de festejar alguns dos aniversários tal é a sua capacidade de brincar, rir e fazer rir. É impetuoso e valente. Se um dia me perdesse dentro de uma caverna haveria uma primeira pessoa a encontrar-me. Seria ele.

Conheço muitos irmãos. Não conheço dois que sejam como vocês. Não conheço três que sejam como nós.

(Mãe, Pai, como conseguiram?)

2 comentários:

  1. Conheço muitos irmãos. Não conheço "irmãos" como estes!
    Texto maravilhoso para irmãos, pais e toda a gente ler e ficar de nózito na garganta!
    Parabéns Nuno! Parabéns Família Chung!

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  2. Nuninho, como disse o teu avô Chung quando vocês nasceram que eu não tinha três filhos mas sim ouro. Iguais é difícil.
    Obrigada por serem meus filhos!!!!

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