domingo, 12 de agosto de 2018

Futuro

Inquieta-me não saber qual será o futuro da Humanidade!
Tentar prevê-lo é um exercício tão difícil como absurdo. Por uma única razão: pela variável tempo. 
Consigo fazê-lo a 100 anos.
Consigo fazê-lo a 1000 anos.
Posso até tentar fazê-lo a 10000 anos. 
Imagino um Homem a sobreviver a alterações drásticas de clima e recursos da nossa Terra.
A crescer em direção a outros mundos, eventualmente a habitá-los. 
A fundir-se em tecnologia aproximando-se de um ciborgue. 
Consigo imaginar o Homem a ser cada vez menos Homem. 
Mas e depois?
Como imaginar a 100000 anos? Ainda seremos Homens?
Reproduzir-nos-emos em laboratório?
Viveremos uma realidade de guerra e sobrevivência ou de paz e harmonia?
Teremos utilizado a tecnologia para nos aumentar ou para nos destruir?
E como imaginar a 1 milhão de anos? Ainda seremos Homens?
Onde estaremos? Em que planetas? Neste sistema solar?
Viveremos a par de outras civilizações ou continuaremos sós?
Que recordações teremos do Homem que hoje vive no planeta Terra?
E como imaginar a 100 milhões de anos?
Estaremos vivos? Estaremos mesmo vivos?
Ou teremos passado à história como hoje olhamos para os dinossauros?
E se estivermos vivos? Ainda seremos Homens? Ainda existem os conceitos de família, amigos e namorados? Até que idade viveremos? Seremos imortais? Viajaremos no tempo? Ainda viveremos nesta galáxia? Já teremos descoberto A Teoria do Tudo?
E como imaginar a 1000 milhões de anos?
Já teremos encontrado alguma outra civilização? Terá nascido alguma outra entretanto? Ainda estaremos por cá? O que teremos de comum com o que somos hoje? A vida desses homens continuará a ser alimentada por um coração que bate ininterruptamente? Existirá a morte? Esses homens terão também dúvidas sobre o seu futuro? Viverão mais descansados em relação a ele ou mais aterrorizados por um fim próximo?
E como imaginar a 10000 milhões de anos?
O nosso sol, a nossa Terra, o nosso sistema solar já não existirá. Se existirem homens daqui a 10000 milhões de anos, saberão que nascemos aqui? Que evoluímos a partir do nada neste planeta? Que aprendemos a andar e a comunicar na Terra? Saberão que terá existido uma Via Láctea?
Mesmo que o Homem atravesse toda esta eternidade, como lidará com um fim pré-anunciado deste Universo? Teremos evoluído para um outro universo e assegurado a nossa sobrevivência?
Será que esta aventura humana que agora começou é o principio de tudo?
Ou apenas um episódio fugaz e acidental do nosso cosmos?
Preciso de respostas...

Que nunca terei. 

sábado, 11 de agosto de 2018

Música

Já há algum tempo que não passo por aqui. Mas há pouco tempo pediram-me para escrever. De vez em quando fazem-no. Não muitas vezes. Mas quando o fazem, sinto-me em dívida para com essas pessoas. Dizer que não escrevo porque não tenho tempo é um eufemismo. Não escrevo porque escrever é difícil. Exige-me, mais do que tempo, tempo para parar, para concentrar, para reflectir, para exteriorizar, para aperfeiçoar. Requer de mim próprio um estado emocional particular. 
É a música que me cria esse estado de espírito. Que me eleva do piso térreo da consciência, que me coloca as ideias em perspectiva, que me aumenta os sentidos.  
Nunca fui extraordinariamente musical.  Na infância recordo-me de ter tido aulas de piano e pouco mais. Não posso dizer que tenha música no corpo. A minha relação com a dança é péssima e até à adolescência a música nunca foi algo de importante na minha vida. 
Até que veio a rebeldia da adolescência. Enquanto adolescente, a música ajudou-me a encontrar o meu espaço e a moldar a minha personalidade. A superar muitas dúvidas e incertezas e a libertar frustração e raiva. Foi a fase do metal mais extremo (que ainda hoje oiço). Quando não me ajudou a encontrar o meu espaço, ajudou-me pelo menos a não me sentir sozinho onde quer que estivesse. 
A vida familiar, anos mais tarde, voltou a apagar o fogo da música, a pô-la em segundo plano. Até que a música contemporânea e clássica entrou em cena há uns bons anos atrás. 
Para mim a música são dois extremos. A brutalidade do metal e a perfeição da música clássica e contemporânea. Têm muito poucas coisas em comum. Provocam-me estados de espírito muito diferentes. 
No metal, não procuro nada. Não recebo nada. Para mim ouvir metal é quase como sintonizar o meu corpo e mente num estado que me permite libertar de muitas coisas negativas. Esta música ajuda-me a encontrá-las dentro de mim e a libertá-las. A tristeza é algo que associo muito a esta música. E quando a oiço não tenho medo de a sentir. 
Na música clássica e contemporânea, sou mais egoísta. Não dou nada de mim. Vou à procura de receber alguma coisa. Enquanto no metal o sentido é de dentro para fora nesta música passa-se o inverso. Com ela procuro descobrir-me, descobrir o que existe dentro de mim. Serve de amplificador de alguns sentimentos, principalmente do amor e da melancolia. Oiço-a para ampliar estes sentimentos, para vivê-los e para os encontrar. Esse egoísmo revela-se também na obrigatoriedade que tenho de a ouvir para escrever. 
Tudo o que escrevo é feito ao som de musica clássica ou contemporânea. E é a única música que oiço quando escrevo. Tudo fica mais nítido. Tudo fica mais à flor da pele. 
E escrever é a única coisa que dou em troca. Nada mais. 

É este o efeito que a música tem em mim. Nada mais. 

terça-feira, 8 de agosto de 2017

O que é a felicidade?



É um conjunto de sensações físicas e emoções agradáveis ou é mais do que isso? É a felicidade o desígnio das nossas vidas?
O que era a felicidade para os nossos antepassados? O que é ser-se feliz em África há 5 milhões de anos quando dormimos em cavernas, aquecemo-nos com peles de animais e a principal actividade diária é caçar/pescar para comer, avançando em novos territórios quando a comida acaba ou as doenças aparecem?
E o que é ser-se feliz quando não temos plena consciência de nós próprios? Admitamos que antes de termos consciência de nós próprios não existe um conceito de felicidade. Existem apenas boas e más sensações e emoções. Vivemos o momento, sem expectativas, em pleno mindfulness.
Em 99% do tempo em que o Universo existe é este o estado consciente dominante. A vida apareceu no nosso planeta há 3,6 mil milhões de anos. Só nos últimos 6 milhões o Homem e Macaco se separaram de um antepassado comum. Até aí vou admitir que os nossos antepassados eram felizes quando conseguiam caçar, encontrar abrigo. A infelicidade residiria na morte, doença, fome. Mas a evolução dita um estado crescente de consciência. Será que implica também um estado maior de felicidade?

Há tempos lia sobre a forte correlação comprovada entre o casamento e a felicidade.  Pessoas casadas são tendencialmente mais felizes que pessoas não casadas. Pensamos todos: o casamento induz felicidade. Mas não será o contrário? Não há um lado de felicidade endógena dessas duas pessoas que as leva a casar? O casamento torna as pessoas mais felizes? Ou as pessoas mais felizes casam mais frequentemente?
Em que consiste a felicidade? É um skill com o qual nascemos? Um instrumento para atingir algo? Um objectivo de vida? Um resultado das nossas acções e pensamentos?

Inclino-me para pensar que existem dois tipos de felicidade:

Por um lado, a felicidade mais instintiva comum a todo o mundo animal, consciente ou inconsciente. Um conceito de felicidade mais associado ao prazer.

Por outro lado, a felicidade enquanto conceito humano. Um conceito de felicidade mais associado a expectativas.

Em relação à primeira, tendo a acreditar que a felicidade é apenas um instrumento. Um instrumento de sobrevivência.
Não posso deixar de imaginar 3,6 mil milhões de anos de evolução onde a sobrevivência da espécie é a única coisa que interessa. Milhões de anos repetidos em que o único objectivo é sobreviver. Se por felicidade, entendemos o tal conjunto de sensações agradáveis, o prazer, a minha interpretação é a de que a felicidade é instrumental para a sobrevivência. Porque é que os animais procuram a comida? Porque é que os animais procuram o sexo? Porque estão preocupados com a sua sobrevivência? Talvez. Mas em primeiro lugar pelo prazer associado. Se comer não transmitisse uma sensação positiva, quem comeria? O mesmo com o sexo. A selecção natural ditou que o prazer dessas sensações estaria intimamente ligado à sobrevivência. E se a felicidade representa o tal conjunto de sensações agradáveis, então a felicidade é apenas um instrumento para a sobrevivência das espécies. Não é um fim, mas um meio.

Mas também existe um lado exclusivamente humano da felicidade, associado à nossa consciência individual e colectiva. É um conceito de felicidade que vai para alem das sensações e emoções. Indissociável da consciência que temos quer de nós próprios quer do mundo que nos rodeia
e das expectativas que criamos para nós nesse mundo.

O nosso maior nível de consciência dá-nos essencialmente duas coisas.
Por um lado, uma maior noção de quem somos. Essencialmente uma melhor noção do nosso passado e uma mais clara noção da incerteza do nosso futuro. A questão “donde vimos e para onde vamos” é uma interrogação exclusivamente humana, fulcral para este conceito de felicidade.
Por outro lado, uma maior noção do papel que temos e podemos ter para o colectivo. Porque sabemos que existimos. E sabemos que outros existem. E medimos a nossa existência contra a dos outros. E sabemos que essa medida umas vezes é superior e outras é inferior à medida da existência dos outros membros da nossa espécie. E sabemos que a diferença dessa medida tem necessariamente sensações agradáveis e desagradáveis. É por isso que essa medida não deixa de ser um reforço ou ameaça à nossa sobrevivência.
Este maior nível de consciência, acredito, permite-nos alcançar níveis de felicidade mais extremos. Quer mais altos, quer mais baixos.

A Felicidade é um alvo em movimento. Corresponde ao preenchimento das nossas expectativas. Quais expectativas? Antigamente eram as expectativas do momento. Mas as nossas expectativas são cada vez mais complexas. Já não têm que ver somente com o dia-a-dia: comer, abrigar, estar seguro.
O cada vez maior nível de consciência própria aumenta as expectativas que criamos.
Se as expectativas que criamos de nós próprios aumentam, a felicidade ou a infelicidade podem atingir níveis superiores.

São dois níveis de felicidade diferentes, não necessariamente correlacionados.
Acho que a distribuição da felicidade é hoje muito diferente da de há milhões de anos atrás.
Teremos seguramente muito mais felicidade e muito mais infelicidade à medida que os níveis de consciência aumentam.
No nível mais básico das nossas expectativas, não somos muito diferentes dos nossos antepassados.
Ao nível da consciência individual, é cada vez mais complexa a definição de expectativas para nós próprios. Por um lado temos uma  cada vez omaior consciência da heterogeneidade humana. Por outro, cada indivíduo compete num mundo cada vez maior. Já não chega ser o melhor da aldeia. É preciso ser o melhor do mundo. E ser melhor, já não é tão simples como ser o mais forte, o mais bonito ou o mais inteligente.

Para sermos felizes, acredito que precisamos de quatro coisas:
1. Procurarmos o prazer em tudo o que fazemos no dia-a-dia
2. Atingirmos as expectativas que temos em relação a nós próprios
3. Sermos nós próprios a definir as expectativas em relação a nós
4. Garantirmos que essas expectativas dão um significado à nossa (efémera) existência

Sugiro começar pela ordem inversa.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Free Will

Seremos totalmente livres e donos inequívocos dos nossos comportamentos e acções? Teremos livre vontade? Existe "free will"? Ou não?

Se acreditamos que sim, que somos absolutamente livre, então cada decisão que tomamos tem de ser independente das decisões e experiências passadas. Não existe, nesse caso, um determinismo nem uma definição a priori.
Pelo contrário, podemos acreditar que essas mesmas acções estão predeterminadas e que as nossas acções e decisões são aquelas que sempre decidiríamos em função de sermos quem somos.

Seremos livres, por exemplo, para escolher as nossas opções religiosas?
Seremos totalmente responsáveis por crimes que cometamos?

A nossa consciência é livre, a meu ver, no momento da concepção. Não partilho a visão de Rousseau, segundo a qual nascemos bons sendo a sociedade que nos corrompe. Mas também não partilho a visão de Hobbes, segundo a qual nascemos como bestas sendo a sociedade que nos resgata desse bestialismo.

Mas nascer conscientemente livres não significa que sejamos totalmente livres de determinar as nossas acções. A nossa autodeterminação é condicionada desde o primeiro segundo de vida.

Somos ou não condicionados ao nascer com uma deficiência física?
Somos ou não condicionados por não encaixar física ou psicologicamente no padrão normal?

Perdemos graus de liberdade no exacto instante em que somos comparados com o referencial humano a que chamamos de sociedade. Porque temos a mais. Porque temos a menos. Porque somos mais isto. Porque somos menos aquilo.

Até esse preciso instante não somos nem bons nem maus, não temos qualquer tipo de condicionante. Mas a partir desse momento começamos a coleccionar experiências. A percepcionar as reações das pessoas que nos rodeiam. A estabelecer relações de causalidade com as decisões que tomamos. Se decido arriscar, acontece isto. Se sou mais prudente, acontece aquilo.

Somos livres para determinar as nossas acções? Somos, mas...num contexto longamente determinado pela nossa experiência e pela envolvente moral e ética, pela sociedade. Quão livre sou se todo o padrão ético e moral está predefinido? Sou mesmo livre? Ou sou-o apenas na medida exacta dos graus de liberdade que me são permitidos? E que valor tem esse padrão? Potencia-me enquanto indivíduo ou coarta a potência que existe em mim?

Esse referencial que define a Humanidade não é algo de intrínseco e imutável. Resulta da individualidade de cada um e da sua coexistência. Tenho para mim que esse referencial não maximiza a diversidade e o potencial individual; ao mesmo tempo que acredito que maximize o potencial colectivo. Porque o instinto mais básico é o da sobrevivência. E a sobrevivência individual depende da sobrevivência colectiva. É um padrão que harmoniza e igualiza o indivíduo mas que procura simultaneamente as melhores condições de coexistência e sobrevivência colectiva.

Não somos totalmente livres. Em reflexões anteriores descrevi três tipos de pessoas: As que se comparam com o que acham que deviam ser; as que se comparam com o que querem ser; e as que não se comparam com nada nem ninguém. Resta referir que todas elas são comparadas com aquilo que a sociedade acha que deviam ser. Comparadas com a identidade Humana. As escolhas que cada indivíduo faz durante a sua vida definem a humanidade que conhecemos hoje. Para o bem e para o mal, toda e qualquer escolha que fazemos, define-nos individual e colectivamente. Contribuimos para a definição de um padrão ético e moral em cada escolha que fazemos.

Existe melhor/maior estimulo para fazermos as nossas escolhas (mesmo que não totalmente livres)? Estando em maior ou menor medida condicionados pelas escolhas passadas, temos um poder fantástico de poder fazer a diferença para o futuro. Todas as nossas escolhas, acções e decisões determinam a evolução do conceito de Humanidade.

Não somos livres...porque somos humanos. Não somos livres...porque temos memória. Não somos livres...porque temos consciência da nossa humanidade. Mas quem sou "eu" então? Sou apenas o resultado de todas as escolhas que fiz? Não. Aquilo que somos não é nunca algo de absoluto. Seremos sempre definidos relativamente a um referencial móvel. Mas podemos contribuir para a definição desse referencial. O que significa que sermos bons ou maus, bonitos ou feios não está apenas em nós mas também nesse referencial móvel - a sociedade - que temos a capacidade inequívoca de ajudar a definir.

"The world is a dangerous place, not because of those who do evil, but because of those who look on and do nothing." - Albert Einstein

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Talvez exista, logo penso.

Existo onde sou visto. Existirei onde não chega a minha luz?

A estrela mais perto de nós com maiores possibilidades de existência de Vida está a cerca de 200 anos-luz do nosso sistema solar.
O que significa que se lá estiver alguém neste momento, e se tiver a hipótese de nos estar a observar, estará a ver algo como o nascimento dos EUA.
Poderá ver muitas coisas. Mas por muito que se esforce, não me poderá ver a mim. A minha luz demorará outros 200 anos a lá chegar. O que significa que apesar de eu aqui estar, não sou visto pelos habitantes desse planeta.

Se assim é:
- Eu existo?
- É possivel existir-se num sítio onde ainda não chegou a nossa luz?
Julgo que sim, que existo. Mas apenas aonde a minha luz já chegou. Aprendemos com Einstein que o espaço e tempo são a mesma e única dimensão. O que significa que existimos neste espaço e neste tempo, neste preciso espaço-tempo.

Onde mais existimos? Onde mais este espaço-tempo puder ser visto, ou seja, onde chegar a luz por ele emitida. Onde é isso? Todo e qualquer lugar por onde passar a nossa luz a mais de 300.000 kms por segundo. É muito? É. Mas demora 200 anos a chegar à tal estrela mais próxima. Ou seja, ainda não existo...lá. Eu existo aqui, agora e até ao limite da velocidade da luz da minha existência.
O que significa que a minha própria existência é um conceito relativo. Existo para alguns, não existo para outros...

Não posso dissociar o espaço e o tempo que ocupo. São um só. Sei que o espaço-tempo é uma seta que não anda para trás, apenas para a frente. Sei que existo para quem está no meu universo visível e que (parece que) não existo para quem está para além desses limites.

Mas posso olhar para trás. Posso olhar para o nosso sol, por exemplo, e saber que o sol que vejo é o sol que lá estava há oito minutos atrás (o sol dista oito minutos-luz da Terra). O sol que vejo agora pode não estar lá neste meu espaco-tempo.

E posso ir ainda mais longe. Posso olhar para essa estrela a 200 anos-luz e imaginar que lá vejo seres vivos. Esses seres, que lá existiam há 200 anos, podem hoje não existir. Mas pensam que existem, no espaço-tempo deles.

O que significa que a existência é relativa. Como posso ter a certeza de que não estou a ser observado por outros seres que estão 200 anos-luz à frente a olhar para trás a fazer o mesmo raciocínio: olha os humanos! A imagem que vemos deles (sim, a deste espaço-momento) já tem 200 anos...

Continuo a ter a certeza que existo...mas já não sei se estou no presente (ou no passado). A minha existência nao precede a minha concepção, porquanto foi a partir desse momento que passei a emanar luz. Mas quanto mais a minha luz viajar a essa impressionante velocidade mais longe irá a minha existência. O que significa que em última instância estarei em todo o lado, em todo o Universo, omnipresente...qual Deus...o meu próprio Deus...

sábado, 12 de dezembro de 2015

Cai sobre mim uma paz...

...tal como um crepúsculo em que o sol, qual estrela, mergulha sobre um oceano nele desaparecendo como que o aquecendo e reconfortando. Estrelas. matéria. Poeira. Poeira de estrelas. Um infinito preenchido por poeira de estrelas. Uma comunhão imensa de matéria. Combinações infinitas de matéria. Complexidade crescente de matéria. Surge a Vida num ponto minúsculo do Universo. Surge a inteligência sob a forma humana. Surge a consciência do tudo que nos rodeia.

Como compreender uma escala não-humana? Como aceitar o absurdo da existência? Atribuindo-lhe um significado. Um propósito. Aceitando o resultado da evolução.
A normalidade de uma existência que se desenvolve há 13,82 mil milhões de anos.
A naturalidade de uma vida que nada mais é do que um modo de existência complexo.
A singularidade de uma maravilhosa consciência que nada mais é do que um modo de vida complexo.
Aceitando que essa consciência nasce da poeira de estrelas e morre como poeira de estrelas. Aceitando que quer esse nascimento quer essa morte são ambos passos dessa evolução intemporal não-humana. Pequenos passos naturais. Pequeníssimos passos. Um continuo de passos.

Não nascemos e não morremos.

Fazemos parte de um todo muito maior. Comungamos a mesma matéria. A partir dessa matéria complexificamo-nos e atingimos níveis de consciência crescentes que mais cedo ou mais tarde regressam ao seu estado original. Nascemos da poeira e à poeira regressamos. Entretanto somos algo complexo que procura um significado. Um significado complexo.

Procuramos demasiado um significado humano para o universo em vez de procurarmos um significado para o humano no universo.

Procuramos demasiado um significado em vez de um propósito. O mundo em que vivemos não tem que ter necessariamente um significado. Mas tem que ter um propósito. Um propósito simultaneamente individual e colectivo. Individual porque tem ser criado pela entidade única que somos cada um de nós. Colectivo porque um só humano não faz a humanidade. A humanidade é o resultado da relação entre as consciências que a compõem. Somos nós que definimos a humanidade.  Saibamos definir os nossos propósitos em função da visão que tenhamos dela.

sábado, 3 de outubro de 2015

Conheço três tipos de pessoas...


As que se medem contra quem acham que deviam ser.
As que se medem contra quem acham que querem ser.
E as que... não se medem contra nada.

No primeiro grupo encontro vulgarmente pessoas fortemente condicionadas por padrões sociais. Sabem quem acham que deviam ser. Podem ou não saber quem querem ser. Mas medem-se e medem-se sobretudo pelo gap entre ser e dever ser. Tipicamente deficitário. Vivem prisioneiras de um dever ser edificado a partir de fora, embora muitas acreditem que faz parte do seu próprio eu.

No segundo grupo encontro pessoas que sabem quem querem ser. Podem ou não ter um referencial do que deveriam ser. São mais livres quando não o têm. São menos quando o têm. E quando o têm pode até coincidir o querer ser e o dever ser. Aí são fortes. Quando não coincidem, vivem num purgatório entre um dever ser e um querer ser muito distantes.

Cada uma destas combinações caracteriza-se por diferentes graus de consciência, da transparência com que nos olhamos, da intensidade com que nos pensamos, da interpretação da nossa própria liberdade. 
A que nos deram e a que nós nos demos.
É a interpretação desta liberdade que marca a diferença. De acharmos que podemos querer ser independentemente do dever ser. 
De assumirmos as rédeas do nosso próprio destino, individual e colectivo.
Como assumir?
Aceitando, em primeiro lugar, o absurdo da nossa existência. A improbabilidade que lhe está associada. O vazio do infinito. A escala não humana do espaco-tempo. Acreditando que a definição de humanidade está em cada um de nós e que são os nossos actos e nada mais que a definem. 
Criando um propósito e um sentido para a vida. E medindo-nos contra ele.


domingo, 9 de agosto de 2015


Imerso no silêncio dos céus, sinto a felicidade de ter os meus dois irmãos. Nasci no meio deles. Cresci entre eles. Sou um deles.

O que sinto por eles é muito diferente do que um filho sente por um pai ou que um pai sente por um filho. Não há uma dívida como para com os pais. Não há um dever como para com os filhos. Há, antes, uma cumplicidade que é difícil de descrever.

Por vezes penso em como seria muito improvável ser amigo deles, se não fosse irmão. Sou muito selecto com amigos. Mas eles são os meus melhores. Porque são os meus irmãos. Não precisamos gostar das mesmas coisas nem ter concepções de vida semelhantes. Mas são os meus cúmplices.

Ninguém, absolutamente ninguém, me acompanhou nesta viagem de 39 anos como eles acompanharam. A Inês já só me conheceu aos 16 e as meninas depois dos 26. Pais e avós viram-me nascer, mas a partir do altar da experiência das suas vidas. Os meus irmãos não, esses acompanharam-me desde o início partilhando desde o primeiro dia esse trajecto.

Começámos por partilhar muitas coisas de que nem sequer tenho consciência. Partilhámos a pureza da infância, as brincadeiras, a bola, a areia e a terra, os arranhões, a praia e os escaldões, a casa dos avós e as viagens enormes nos carros dos pais. Partilhámos a nossa mãe de trinta e poucos anos e o nosso pai quarentão. Nunca fomos três. Fomos sempre os três. Partilhámos o desafio da adolescência, os amigos, as raparigas, as notas e os professores, as bicicletas e os arrepios às ordens dos pais. Partilhámos as frustrações, as inseguranças e os medos. Partilhámos o labor dos nossos pais. Partilhámos o Amor dos nossos pais. Partilhámos a constituição das nossas famílias, os nossos casamentos e o nascimento dos nossos filhos. Alargámo-nos. Vimos os nossos pais envelhecerem e vimo-nos, juntos, a ocupar o lugar que antes era deles. Deixámos de ser miúdos ao mesmo tempo.

Passámos 38 anos imensamente perto. Lado a lado. Ou no meio, no meu caso. Nasci no meio. Sempre fui o do meio. No quarto do meio. No lugar do meio no banco de trás do carro. No lugar do meio à mesa de refeição. Menos um ano que o mais velho. Mais um ano que o mais novo.

Não consigo descrever o quanto me inspira o meu irmão Ricardo. É o meu irmão mais velho. Tranquiliza-me, pacifica-me. A cada dia que passa sinto-me mais perto dele. Fala pouco sobre sentimentos, sempre falou. Não foi uma criança muito fácil, nem muito segura do seu destino. Tinha medos apesar de ser corajoso. Foi o primeiro, para todos os efeitos. Mais protegido. Soube crescer. Foi o que esteve sempre mais perto dos pais. E soube aprender com eles. Recolher os seus valores. Ganhou uma paz interior que nunca acreditei ser possível. É um guerreiro e um sonhador. Defende agora os seus próprios valores. Está em harmonia com a vida. Retira dela o que tem de melhor. E contagia-me.

O João é o meu irmão mais pequeno. É o Pini. Ou Shumba. Ou Shimba. Ou Shumagala. Ou Johnny. Ou simplesmente Bro. Este é mais complicado, terceiro filho. Teve de lutar para ganhar o seu espaço. E ganhou. A prova disso é que se perguntarem a terceiros quem é o filho preferido dos pais, é melhor apostarem tripla. Sempre foi pequenino, o mais pequeno. É o melhor irmão de todos os três (envergonho-me de ser o pior, mas tenho melhorado, acho). Realiza-se a ajudar. É cheio de vida e juventude. Dizem que faz 38 anos este ano mas acho que nos devemos ter esquecido de festejar alguns dos aniversários tal é a sua capacidade de brincar, rir e fazer rir. É impetuoso e valente. Se um dia me perdesse dentro de uma caverna haveria uma primeira pessoa a encontrar-me. Seria ele.

Conheço muitos irmãos. Não conheço dois que sejam como vocês. Não conheço três que sejam como nós.

(Mãe, Pai, como conseguiram?)

domingo, 8 de março de 2015

Inerte, inconsciente, ausente. Morto. Perante a morte, celebro a consciência.
A capacidade de nos apercebermos de nós próprios, de olharmos em volta e de questionarmos. Atributo exclusivo dos seres inteligentes. Recente.

Tento imaginar uma existência inconsciente, que apenas existe. Sem se questionar. A existência amoral de mares e terra. A rotação mágica da Terra. Sem que pedras se toquem, nuvens se cansem ou marés se acalmem. Tempos atrás de tempos num ritmo vertiginosamente lento.
Que significado tem a morte neste mundo?

Aparece a Vida. No mar ou em terra, seres vivos inconscientes sucedem-se interminavelmente nascendo e perecendo indefinidamente. Insectos, répteis ou mamíferos cessam a sua existência em momentos desprovidos de qualquer emoção ou sem que lhes seja atribuído qualquer significado.
Que significado tem a morte neste mundo?

A complexidade aumenta, no entanto. As emoções são adicionadas à equação e sente-se a morte. Ainda que mantendo-se desprovida de qualquer significado. Seres vivos celebram o nascimento e a morte. Um qualquer primata sente a tristeza da partida de um dos seus sem que lhe seja dada a faculdade de questionar aquele momento. Apenas sente.
Que significado tem a morte neste mundo?

Mas algures na seta do tempo, apercebemo-nos de nos próprios. E questionamos. Individualizamos. Criamos o Eu. Celebramos o seu nascimento. E questionamos a morte. Procuramos um significado que nunca até então foi procurado. Procuramos uma razão que até então não existia. Procuramos. Providos de uma consciência durante muito tempo inexistente. Conscientes da vida. Conscientes da morte.

Deitado sobre a terra, encostado a uma árvore, sinto a minha existência. O sol resplandece no meu corpo, sinto o peso da gravidade. As raízes de uma árvore abraçam-me como uma mãe abraça um filho. Sinto o regresso à origem. O fim. Sem respostas. Em paz. Conscientemente inconsciente.
Porque precisaria a morte de ter um significado neste mundo?

Na Vida, o que é verdadeiramente extraordinário, não é a morte. É a consciência.

quarta-feira, 11 de junho de 2014

O meu jardim



A Joana é o meu maior desafio. Vive num estado de atenção permanente. Controladora como o pai, nada lhe escapa. Sofre por antecipação, exige respostas para tudo. Efervescente, ainda não olha para dentro. Evita, tem medo. Estar na sua cabeça é como estar sentado ao volante de um carro citadino com um motor de F1. Tem dias em que consegue dosear o acelerador, não sai de pista e chega em primeiro. Tem outros, em que ainda não fechou a porta do carro e já está a acelerar a fundo. Passa do 8 ao 80 num segundo, temperamental. Ri, chora e grita com uma facilidade inacreditável, muitas vezes tudo ao mesmo tempo. É uma criança imensamente sensível (com a irmã tem momentos…). É uma filha maravilhosa com uma noção de família ímpar. É inteligente e esperta (e sabe-o) e move-se por objectivos. Gosta de se sentir crescida e abordar os adultos. É exigente consigo e principalmente com os outros. O mundo para ela ainda não tem limites (embora lhe custe a dormir fora de casa). É valente…durante o dia. A noite traz-lhe as inseguranças e os medos. “A partir das oito horas…”, como ela diz. Vai ser grande na vida. Pessoas como ela movem mundos. Diz que quer ser jornalista. A mim parece-me mais virada para os números ou mesmo…política. Educar a Joana deixa-me…realizado. Nada na minha vida se compara ao desafio de a educar. Obrigado por existires, Joaninha. Foi contigo que criei o meu jardim.

A Ritinha é o meu doce, o meu moranguinho com chantilly. Passa a vida a rir, contamina-nos com boa disposição. Adora bebés. O seu sonho era ser bebé, e julgo que ainda tem o cheirinho deles. Deve dormir com mais de vinte bonecos na sua cama. O seu mundo é a sua casa e os seus brinquedos. Tudo o resto é acessório. Estar na sua cabeça é como estar num mundo onde tudo é perfeito e…cor-de-rosa. Um mundo de príncipes e princesas, fadas e magia. Inabalável e independente do mundo real. Mas tem outro. Tem a música e a dança no corpo (ao contrário dos pais). Quando crescer arrebatará corações. Balanceará entre a timidez e as paixões. Não gosta de lutas, mas aprendeu a lutar, a ganhar o seu espaço. A Joana que o diga. É inteligente e humana. Viverá sempre a sua própria vida, independente e feliz. Pessoas como ela dão sentido aos mundos. Ainda não sabe o que quer ser. Ciências, digo eu. Educar a Ritinha…é das tarefas mais fáceis do mundo. É uma flor que precisa apenas de um pouco de água todos os dias. Obrigado por dares cor ao meu jardim, minha Ritinha.